HOMILIES

“Estive na prisão e fostes ter comigo”: 108 vidas destroçadas e uma luz pascal para os que ficaram. Homilia do Pe. Marco Gnavi

 

15 ade abril de 2025 - Santa Maria in Trastevere - Semana Santa

Oração em memória das pessoas que morreram na prisão

Mateus 25, 31-40

31*«Quando o Filho do Homem vier na sua glória, acompanhado por todos os seus anjos, há-de sentar-se no seu trono de glória. 32*Perante Ele, vão reunir-se todos os povos e Ele separará as pessoas umas das outras, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. 33À sua direita porá as ovelhas e à sua esquerda, os cabritos.

34O Rei dirá, então, aos da sua direita: 'Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo. 35Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, 36estava nu e destes-me que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo.'

37Então, os justos vão responder-lhe: 'Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, ou com sede e te demos de beber? 38Quando te vimos peregrino e te recolhemos, ou nu e te vestimos? 39E quando te vimos doente ou na prisão, e fomos visitar-te?' 40*E o Rei vai dizer-lhes, em resposta: 'Em verdade vos digo: Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes'».

Caros amigos,

na paixão de Jesus, a vida e a morte enfrentam-se num duelo prodigioso. Ele, o amigo dos pecadores e o mais ferido, luta para que a vida floresça onde a morte parece dominar. Jesus quer arrebatar do inferno e do suplício aqueles que mais sofrem, neles se identificando plenamente.

Jesus, o único inocente, tem o rosto do prisioneiro, muitas vezes nu, com fome, com sede, doente. Pede para ser visitado e amado, quebrando todo o julgamento precisamente onde o estigma e a solidão querem vencer e extinguir toda a esperança. Mistura-se entre eles e habita a sua humanidade, porque todos são dignos de amor e todos são dignos de salvação.

No centro da oração desta noite estão 108 vidas quebradas pelo desespero, enquanto pelo menos 2262 foram salvas in extremis por colegas reclusos ou agentes. E isto aconteceu desde janeiro de 2024 até ao presente. Outros 204 morreram em locais de detenção, onde, com demasiada facilidade, qualquer fragilidade se transforma em patologia, ampliando o desconforto e o sofrimento.

Estas vidas, estas mulheres e estes homens interpelam a nossa oração e pedem que esta noite se acenda uma luz pascal de ressurreição, por aqueles que nos deixaram e por todos aqueles que ficaram para trás. Que eles conheçam e experimentem finalmente a Páscoa. Jesus restitui-os a nós como irmãos e irmãs.

Assuas feridas são as feridas deles, as do corpo, da alma, da mente que, no abandono, se torna presa da divisão. No nosso país, há 6.000 prisioneiros com um diagnóstico psiquiátrico grave e 15.000 que usam drogas psiquiátricas.

Deus não tolera o poder esmagador do mal, por isso enviou o seu filho e é por isso que ele está na prisão, para que a revolução do Evangelho comece também aqui e a sua compaixão esteja viva em todo o lado. Aqui está a redenção oferecida pelo próprio Jesus, a conversão de todos ao amor, a libertação do mal, uma justiça misericordiosa, a proteção dos mais fracos e a defesa da dignidade de todos. E o perdão, para aqueles que se tornam pedintes desesperados, e não sabem a quem pedir e como oferecê-lo.

Libertar os presos e levar a boa nova aos pobres é a vida dos cristãos, porque é a vida de Jesus. Quanta dor, porém, quando a janela para o amanhã parece gradeada e fechada para sempre. Quantas mães feridas pela distância dos seus filhos ou da sua família, ou pela culpa de não os terem protegido. Quantos jovens perdidos são um apelo vivo para a Igreja, para a sociedade, para se tornarem mães e pais para aqueles que já não os têm ou nunca os tiveram.

Há entre eles quem tenha experimentado o terror de entrar na prisão ou mesmo o terror da liberdade, quando não há ninguém lá fora à sua espera. E no abandono, quantos vícios mortais reduzem a existência a nada.

Os salmos dão palavras a estas dores: “Não escondas de mim o teu rosto no dia da minha angústia. Estende para mim o teu ouvido, quando te invoco, e responde-me depressa. Salmo 102. E na solidão de uma cela: Não te afastes de mim, pois a angústia está próxima e não há ninguém que me ajude.

Outros ainda, adultos e idosos, podem pedir que não se morra mais à espera de cuidados nem sempre garantidos. E ainda, nos Centros de Permanência e de Expulsão, quantos, sentindo que não têm futuro depois de terem atravessado o Mediterrâneo, os desertos e as montanhas com risco de vida, são mergulhados num sentimento de medo ou de fracasso final?

Mas quando Jesus entra em Jerusalém, na sua comitiva há doentes curados, há amigos, há pessoas libertadas de demónios. Jesus tinha-se tornado o seu próximo e nele tinham reconhecido um amor que não os julgava, que os separava da raiz do seu sofrimento, curando-os e permitindo-lhes fazer o bem. E muitos tornaram-se seus discípulos. Jesus devolveu o sentido à vida. Eles são os primeiros, na sua necessidade, a dar louvores e são os primeiros a quem o Reino é prometido.

Como é surpreendente ver ressurgir a esperança quando se é ouvido e abraçado, mesmo dentro de uma cela. E mesmo quando se é ferido pelo mal ou pela dor, Jesus ajuda-nos a reerguer. A mão de um amigo, o olhar capaz de captar o abismo da alma e o pensamento doloroso, são um primeiro brilho de vida que rompe a escuridão. São o primeiro passo de um caminho que Jesus quer de libertação plena e que deve e precisa de continuar.

A gratidão que nos investe é verdadeiramente desproporcionada em relação às migalhas de amor que caem da nossa mesa. Essa gratidão torna-se muitas vezes uma oração que nos protege. Hoje, envolvidos na aliança de Jesus com cada pessoa na prisão, rezamos por aqueles que estão perdidos e por aqueles que vivem.

Que o Senhor ampare os que estão a ser julgados e nos ajude a libertá-los da condenação sem recurso, para que juntos sejamos libertados do mal. E, nesta Páscoa, fortaleçamos o nosso amor na coragem laboriosa e na oração.

Concede-nos, Senhor, que te encontremos e te amemos. Vós que dissestes: "Todas as vezes que fizestes uma destas coisas a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizestes. Amém.

Padre Marco Gnavi